segunda-feira, 6 de maio de 2013


MIMOSAS

 

Ouro descendo em manto pelas serras,

ladeando caminhos e veredas,

 frescura de tardia Primavera.

Maio.

Maio florido do meu País,

das conquistas, do trabalho,

 Maio da Mãe da terra e do céu,

das maias e tojos em flor.

Meu País, vestido de ouro,

de joelhos.

Uma vez mais de mão estendida,

cabeça inclinada de vencido,

por nunca ter entendido

que o caminho se faz plano.

Todos são precisos. É um engano

ser cada um melhor que o vizinho.

A cobiça, aquele toque nacional,

armadilha é,  vício daninho.

Dos nossos dizemos mal.

Se não são vesgos, são coxos,

são despóticos ou frouxos.

São indignos de mandar!

Mas àqueles que nos pisam,

que vêm doutras paragens,

cobertos de vãs roupagens,

recebemos com abraços

sorrindo como devassos.

 E vendemos por dois reais

a alma, a vida e os quintais.

Meu País de Maio e rosas

vestido de ouro das mimosas,

perdido e ajoelhado,

emprenha  teu solo de semente,

reconquista o mar que te pertence,

comunga os teus prados, o teu sangue,

e não voltarás a ser mandado!

 

Helena Guimarães

MANHÃ DE INVERNO

 

 

Escorrega a chuva nas gaivotas

que voam contra o vento,

o sol esquivo

desenha verde

no cinzento do mar.

 A espuma desnuda nos rochedos

 uma dança erótica de véus brancos e diáfanos.

Dança de manhã saciada!

Uma tristeza sem sentido

visita-me no sonho

de um futuro incompleto.

Mas o dia desagua aqui

na solidão de uma vida completa

das ausências

que vamos sepultando

na memória.

 

Helena Guimarães
                                  CONTIGO À LAREIRA

 

 

Vem.

Senta no meu colo

aqui junto da lareira.

Quero conduzir-te

no descobrir das coisas simples,

essas coisas sem idade

onde, sem procura nem canseira,

está escondida a felicidade.

Vê,

lá fora o vento verga as árvores

e despenteia os pássaros.

O frio adormeceu as roseiras

e as pionias do jardim.

Existe uma gélida claridade

que abraça os ramos do jasmim.

Além, um bando de estorninhos,

manto negro a cortar os céus,

desce a procurar o gão

e as alvéolas vão atrás do arado

que rasga a terra a semear o pão.

Escuta

o chiar do carro puxado pelos bois

que se arrasta pela ladeira acima.

 

Em casa o calor nos une,

neste devir sem tempo

que cheira a pão fresco

e a café ao lume.

A gata enrosca o sono

num pedaço de tapete

com um filhote a dormir em cima

e o vaso da begónia

tem um pouco de verdete.

Na lareira saltam as faúlhas

e do cesto espreita um novelo

espetado por um par de agulhas.

Em cima da mesa,

porque alguém o trouxe,

está, ao pé das camélias,

um prato de arroz-doce.

Repara!

O sorriso escorre das conversas,

dos olhos a sinceridade,

na linguagem dos corpos

a cumplicidade

e o carinho veste os pequenos gestos

que adoça de pertença o dia a dia.

Sabes,

nesta beleza das pequenas coisas

não acontece solidão

nem tem lugar a nostalgia.

 

Helena Guimarães

 

ESPIGAS


 


Lembro-me…


Os teus olhos tinham


o dourado das espigas sazonadas


das planícies alentejanas


e uma alegria de sol poente


que te adoçava o sorriso.


 


Prouvera que fossem verdes


como a nossa Primavera,


com cambiantes de paixão


e ternura nos gestos.


Mas eram da cor do mel!


de brilho lânguido e esquivo.


Promessas de universo


para além de nós.


 


Feneceram os olhos


e os universos pararam ao virar da esquina.


Há uma saudade líquida


nas pupilas cor de palha


que lhe dilui os contornos


Saudades do que não foi!


 

 

                                    Helena Guimarães

CANSAÇO

Um cansaço de vontade

elanguesce-me o corpo,

aperta-me a fronte.

Não encontro o caminho

para além de mim.

O mar lambe a areia

saciado da raiva da tormenta

e a brisa gelada

esvoaça nas penas das gaivotas

que descansam na areia,

em lamúrias de gritos e voos rasos.

O sol atravessa a vidraça

mas está frio.

O frio lá de fora no meu peito.

Eu, sou apenas eu

enrolada em mim.

A vida a espraiar-se a meu lado,

 o cansaço a prender-me as mãos.

Já não há caminho para o infinito!

 

Helena Guimarães

JÁ NÃO ESCREVO POESIA

 

Já não escrevo poesia.

Tento, não há maneira.

É tempo de prosa dura.

Que uma mulher, por inteira,

rasga-se por dentro em agrura,

ao ver o irmão que passa

a tentar cumprir-se Homem

e a esconder a vergonha

de nunca o poder ser.

Já não escrevo poesia.

Perdi o sol e o mar,

a alba e o poente,

a beleza deste chão

onde aprendi a ser gente.

Perdi o caminho da alma,

amarraram-me ao cifrão

neste País desesperado,

sem rumo, amodorrado,

sem achar a solução.

 

Helena Guimarães

AS PALAVRAS ESTÃO GASTAS


 

As palavras estão gastas!

As ideias redondas, buriladas.

A lógica afunda-se absurda

e o que não é explode

dos lábios do impostor.

Tristeza em ondas invade

 ruas, bairros, céu e chão,

 serras campos e baldios.

E o Homem grita a impotência,

e a incapacidade de vencer os desafios.

Traz o Inverno na alma,

traz a fome no corpo.

Altos muros se levantam

amarfanhando a vontade.

Onde está a Liberdade?

As palavras estão gastas!

A lógica é absurda.

As faixas não tem sentido,

os gritos não têm asas.

Esbarram em orelha surda.

E a vontade de todos

soçobra ao poder de alguns.

O cansaço nos esmaga,

tiram-nos a casa e o pão.

As palavras estão gastas!

A lógica é absurda.

Estamos em servidão.

Helena Guimarães

MULHER

 

Mulher é Terra

é vaso, é semente.

É paz, é guerra,

lágrima, sorriso.`

É força, é luta

é grito.

É regaço e alimento,

Oásis no deserto.

É o amor por dentro.

Mulher é laço

Túnica, sari

Burka ou véu.

É o mundo num abraço,

um bocadinho de céu.

É calor e é desejo.

O infinito num beijo!

 

Helena Guimarães