segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O ABRAÇO

Sentávamo-nos à tarde na esplanada.
O sol no ocaso
purpureava o céu
e espreguiçava-se em prata sobre o mar;
a brisa trazia
murmúrios de concha
nos dedos finos
com que nos afagava os cabelos.
As palavras nasciam puras
e a vida parava ali,
num remanso morno de sorriso,
sem tempo,
sem mágoa,
o olhar elanguescido
de sol, de cor e de corpos morenos,
os sentidos prenhes dos odores mornos
de café e tabaco.
Sentávamo-nos à tarde na esplanada
tecendo no vazio do tempo
os fios do abraço
que nos adoçava a vida.


Este poema ganhou uma "Menção Especial" nos 2ºs Jogos Florais do Século XXI promovidos pelo Movimento Cultural aBrace e Editora aBrace- Brasil, na celebração dos 200 anos da Catedral e do Cabildo de Montevideu.

domingo, 8 de novembro de 2009

OS TEUS SETENTA ANOS

Setenta anos. A vida.
Sinfonia inacabada
escrita a carne e a sangue.
Notas que enlaçam
Vibram,
acarinham
Sorriem doces na afeição,
Cobrem de ouro as palavras
Queimam nos fulgores da paixão.
Notas que sonham
Que dançam,
Que beijam
abraçam
levantam quem ajoelhou.
Acendem a luz da alegria
Pintam o céu de arco-íris.
Desenham hinos no vento
Cobrem-nos de nostalgia.
Os teus setenta anos. A vida.
Uma bela sinfonia.

O FUNERAL

Vejo passar o funeral.
O segundo carro levava duas bandeiras na frente
a marcar a sua diferença social,
mas somente quatro carros o seguiam.
Pergunto-me o que será morrer em Agosto
quando toda a gente está de férias.
É um morrer sozinho
quase anónimo,
sem os amigos que levamos tanto tempo a
conquistar,
sem a família que está longe.
Um morrer contra a maré,
a causar constrangimento.
Uma negação da vida e do social
de que somos tão avaros.
Que lutas travamos por um lugar!
Será que o extinto está ali, ou algures
deitado na praia,
ou a beber um drink na esplanada
ao pé dos seus na negação da morte.
Não gostava de morrer em Agosto!
É a suprema solidão!

DORMES A MEU LADO

Calmo dormes a meu lado.
Sinto-te a respiração cadenciada
do sono induzido pelo comprimido
que te afasta os fantasmas
faz esquecer o dia-a-dia.
Aquela vida que queres
desenhada por ti
e que sempre salta do desenho
e traça montanhas e vales,
redemoinhos
caminhos sinuosos,
sem obedecer às regras
que estavas habituado a conhecer.
Um mapa que já te cansa ler.
Faz-te retesar os nervos.
Dormes a meu lado
com um respirar cadenciado
a esquecer o dia-a-dia
deste mundo que já não é.

sábado, 4 de julho de 2009

ESPIGAS

Lembro-me…
Os teus olhos tinham
o dourado das espigas sazonadas
das planícies alentejanas
e uma alegria de sol poente
que te adoçava o sorriso.

Prouvera que fossem verdes
como a nossa Primavera,
com cambiantes de paixão
e ternura nos gestos.
Mas eram da cor do mel!
De brilho lânguido e esquivo.
Promessas de universo
para além de nós.

Feneceram os olhos
e os universos pararam ao virar da esquina.
Há uma saudade líquida
nas pupilas cor de palha
que lhe dilui os contornos
Saudades do que não foi!

H. G Julho 2009

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

LUAR DE JANEIRO

Não há amor como o primeiro
nem luar como o de Janeiro,
diz o saber popular.
Amor que, natural,explode,
emoções verdadeiras
sem história nem comparações,
como o puro e branco luar
que ilumina as profundas noites
do Inverno.
Luz suave e imensa,
explosão de beleza e quietude
sobre um mundo de gelo e silêncio.
Lá virá o de Agosto
que lhe dá pelo rosto!
Amor sazonado
de espigas plenas
ondulando ao luar
em noites quentes de cigarras.
Amor adulto
quente, calculado,
plenitude de searas de prazer.
Noites curtas de luar vibrante,
longe da mansidão, da naturalidade,
da inocência,
da vastidão da descoberta
do luar de Janeiro